Só a ganância entra em guerra com a natureza

O Secretário Geral da Nações Unidas, António Guterres, em visita ao continente asiático, disse: “A minha geração declarou guerra à natureza”. A mim deixa-me perplexa esta assunção de responsabilidade e digo-lhe que não deve exagerar, pois a sua geração lavou as fraldas dos filhos em tanques de cimento. Comprou produtos a granel nas mercearias embrulhados em jornais velhos. Providenciou alimentos que conservava em salmoiras para o ano inteiro. Amassou e cozeu o pão para a família inteira. Gritou do alto dos montes a chamar os filhos. Escreveu os trabalhos de casa em ardósias. Tomou conhecimento dos acontecimentos do mundo nos rádios dos vizinhos. Deu notícias suas e da guerra em aerogramas. Percorreu quilómetros e quilómetros de estradas e de veredas a pé para levar os filhos ao médico. Só muito tarde a maior parte da sua geração teve direito a viver dignamente, que é assim que se vive se houver avanço civilizacional. Não diga que a sua geração declarou guerra à natureza que isso é uma injustiça para a maior parte das pessoas.

Digo-lhe mais, na juventude, a sua geração viajou pouco. As suas escassas viagens fê-las de comboio, a caminho de outros países onde trabalhava como na escravidão. Só muito tarde comprou automóvel. Raros eram os seres humanos que aproveitavam as viagens de avião. É verdade que a sua geração, António Guterres, assistiu ao arranque e usufruiu das maiores mudanças tecnológicas a que o ser humano ambicionava, mas foi tarde, demasiado tarde para muitos. Mas, apesar das dificuldades vividas, a sua geração considera-se uma felizarda, mas daí a ter declarado guerra à natureza vai uma longa distância.

Senhor Secretário Geral das Nações Unidas não se recrimine, não recrimine a sua geração, porque ela só está a aproveitar um pouco das possibilidades que este “novo mundo” lhe proporciona. Saiba que, mesmo que a ela se dirija, não pode deixar de falar abertamente às gerações depois da sua. Diga-lhes que vivam, que aproveitem as inovações tecnológicas, mas que sejam frugais nos seus usos. Diga-lhes que não enxameiem a terra com equipamentos em desuso. Diga-lhes que estudem cada vez mais e aprendam a diminuir o rasto dos consumos.

Eu sei que quando diz “a minha geração” quer que as pessoas entendam que, há uns anos a esta parte, todos nós, os mais velhos e os mais jovens, não temos a consciência de que muitas das nossas ações infligem grandes males a este nosso Planeta, mas não se esqueça, principalmente, daqueles, poucos que detêm o poder e a riqueza. Vire-se para quem faz viagens de 10 minutos ao espaço afrontando o Mundo com o esbanjamento de dinheiro que tanto falta a outros seres humanos. E quando os mesmos fazem suas corridas de fórmula um e de outras categorias empestando o ar que respiramos e contaminando os bens de que nos alimentos só para seu deleite não os pode deixar de atingir. Olhe também para aqueles que fecham estradas e pontes em Portugal, e não só, para filmar as velocidades furiosas, parecendo que estão a fazer um favor às populações que só se podem sentir ofendidas. Veja que, muitas vezes, quem vive nas cidades ou a elas quer aceder tem o transito condicionado ou não pode mesmo entrar porque os seus carros velhos são poluentes.

Então e os senhores das armas e das das guerras o que lhes tem a dizer? Veja, por exemplo, o que a Rússia está a fazer dentro da Ucrânia? E a Ucrânia o que faz no seu próprio interior? Atente ao sofrimento de toda a natureza. Vise também os países que com o fundamento desta guerra infame aproveitam para manter e até reativar as centrais a carvão e fazer marcha atrás nas promessas que tinham feito de desativar centrais nucleares

Senhor Secretário Geral da Nações Unidas, não foi a sua geração que abriu uma guerra contra a natureza, foram os homens e as mulheres gananciosos de todas as gerações. Foram os que querem olhar para os números das suas contas chorudas e derreter-se de prazer com tanto dinheiro a que chamam seu.

Imagem: ONU

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