Desobrigado, isentado de obrigações, desonerado, mas que, mesmo assim, se obriga a ser sério e, por vezes pode sentir não estar desobrigado e, por isso, pode ir partilhando o que for de partilhar, sobre vivências, observações, leituras e outras informações. Embora possa considerar útil qualquer informação aqui publicada, lembre-se sempre que esta não substitui a consulta aos serviços competentes, conforme a matéria em causa.
“Vidas sem valor” é um slogan, do Sindicato Nacional da Polícia (SNP), inscrito em outdoor colocado à beira de movimentada estrada de Portugal.
Eu transitava na designada Segunda Circular, em dia de desvio de trânsito por causa das obras, que tardaram, nas faixas de rodagem, quando vi um cartaz ao longe e logo pensei: “que aproveitamento da imagem de profissionais a viver um momento de sofrimento e de tristeza”, mas ao aproximar-me verifiquei que estava enganada, a mensagem não era daquele partido que costuma gritar o seu apoio às forças de segurança. Estava assinada pelo SNP.
Quem diria que uma organização da classe seria capaz de expor, assim, a dor dos seus associados e escrever que as suas vidas não têm valor.
Ora vejam o que mostra o SNP. Um homem caído no chão (sem vida?) e outro de cócoras, ao seu lado, com as mãos na cabeça (rendido? Desesperado? Humilhado?). Os dois estão fardados. São elementos da Polícia. À direita, no cartaz, a frase, em letras garrafais: “vidas sem valor” e, em letras mais pequenas, algumas reivindicações. Triste a imagem e ainda mais triste a frase.
São os representantes da Polícia que expõem assim camaradas. Porque não escrevem, pelos menos, vidas com valor?
Eu gosto de punhos de renda reais. Adoro aqueles que me apertam os pulsos e me enfeitam as mãos. Os figurativos, que designam a mansidão com que algumas pessoas vão vivendo e acautelando as relações com outros seres humanos, desagradam-me. O trato, de quem usa estes punhos excessivamente expostos, é exagerado e mal interpretado. De diplomático, cortês, reservado, habilidoso, elegante e fino, passa a subserviente, adulador, engraxador e muito mais.
Andar com punhos de renda é o que não me apetece mesmo, a maior parte do tempo. Desejo, isso sim, fazer precisamente o contrário. Muitas cautelas inibem-me a personalidade. Adoro ir direta ao assunto, sem injúria. A clareza encanta-me. Aborrece-me rodear as questões. Gosto de deixar a diplomacia aos profissionais. Ultimamente, então, uso punhos mais grosseiros. Os punhos de renda estão a ficar muito na gaveta. Demasiadas vezes dirão algumas pessoas. Desculpem-me, então, mas talvez até me esqueça da gaveta onde os guardo.
Durante algum tempo pensei que o discurso da insustentabilidade da SS e o medo que ele produzia dava votos. Hoje vejo mais nítido. O medo pode gerar negócio e há pessoas que só pensam em dinheiro. Então que sejam claras, assumam o populismo abertamente. Não se envergonhem. Catastrofistas matreiros.
Antes de mais, quero relembrar as pessoas que a Segurança Social tem em pleno funcionamento o Regime Público de Capitalização, nos termos do Decreto-Lei n.o 26/2008, de 22 de fevereiro. Funciona como uma poupança para reforço da pensão. Alguém ouviu uma sugestão relativa a esta possibilidade? É individual. Cada um paga para si.
A sustentabilidade da Segurança Social foi outra vez puxada para o debate político e os nervos das pessoas foram postos em franja. Não se vislumbra qualquer fundamento honesto para que isto aconteça. Mais uma vez ofereceram um estudo a quem, sempre que a oportunidade surge, amplifica as suas conclusões e amedronta as pessoas que recebem legalmente as pensões. Afligem, igualmente, quem está na vida ativa. São estes os principais alvos dos negociantes que assediam a Segurança Social (SS), com o objetivo de que um qualquer fundo privado de pensões receba uma parte das contribuições que são arrecadadas e geridas pela SS.
O dinheiro da maioria dos portugueses é curto, mesmo assim, há quem os queira a descontar para fundos privados de pensões. Se tal viesse a acontecer, claro que os apresentariam como sendo geridos por seres “competentes”, mas não acrescentariam que as suas capacidades de gestão terminariam com um imprevisto que os fizesse percorrer um caminho para algum paraíso fiscal. Se falassem com as pessoas elas lhes diriam que o que têm é pouco e não podem, nem querem, arriscar. Até acrescentariam que têm inteligência e memória! Que ainda têm presentes os descalabros da última crise financeira. Toda a gente recorda. Daí os subterfúgios do discurso.
Com o que se sabe, para chegarem aos que julgam incautos, desrespeitam os pensionistas da SS e da Caixa Geral de Aposentações. Não é aceitável que estes sejam usados como peças que servem objetivos gananciosos. Deviam saber que os atuais pensionistas tiveram as maiores carreiras contributivas de sempre (40, 50 e mais anos) e, também, devem ter descontado sobre os melhores ordenados, em média, que o País pagou. É muito simples de fundamentar esta afirmação e quem duvide que consulte as estatísticas da SS.
Durante algum tempo pensei que o discurso da insustentabilidade da SS e o medo que ele produzia dava votos. Hoje vejo mais nítido. O medo pode gerar negócio e há pessoas que só pensam em dinheiro. Então que sejam claras, assumam o populismo abertamente. Não se envergonhem, porque é isso que querem, catastrofistas matreiros.
Saibam que quem trabalha hoje paga as pensões de quem ontem trabalhou. É mesmo isso. Assim está inscrito no regime da SS. Saibam, também, que não podem atirar isso à cara dos atuais pensionistas, porque eles já pagaram. Mas, sempre que podem, aproveitam para dizer a quem trabalha que não terá pensões no futuro.
Não é verdade. Os ativos pagam para os pensionistas. Mas deixem-me reforçar esta ideia: os pensionistas de hoje, durante 40, 50 e mais anos, pagaram as pensões de quem adquiriu direitos com o regime democrático. Algumas das pessoas, que passaram a receber pensões com o 25 de Abril, trabalharam a vida inteira por conta de outrem, não havendo quem obrigasse os empregadores a pagar contribuições. Claro que tinham direito a viver dignamente e fizerem bem pagar-lhes. Mas também existiram outras que nunca trabalharam e tiveram direito aos mesmos benefícios. Aproveitaram o que o regime democrático trouxe de bom e lá foram requerer as pensões de trabalhadoras do serviço doméstico (leia-se mulheres a dias), só para exemplificar. Não houve avenidas de Roma por todo o País que não aproveitassem as benesses (algumas pessoas pagaram tuta e meia e outras nada). Creio que quem está hoje em constante campanha contra os pensionistas atuais deve conhecer casos destes. Muitos até terão gente muito próxima que ainda aproveita estas pensões.
Hoje que vejo noticiado, na Lusa, que, em 2018, morreram no Mediterrâneo 2262 pessoas e que mais de 113000, das que deixaram os seus países, conseguiram chegar à Europa, recordo uma informação de ontem, no programa ZOOM África, da RTP, bem interessante, sobre a integração de imigrantes num país africano, o Ruanda.
O Ruanda, sim é mesmo esse país, onde, no início dos anos noventa do século passado, aconteceu a devastação de uma etnia que ficou conhecida por o genocídio do Ruanda. Depois das convulsões, que se seguiram às atrocidades, a democracia e a economia têm crescido. As políticas para a integrar quem lhe bate à porta, têm funcionado de forma exemplar.
As pessoas que saem dos seus países à procura de sobrevivência, têm conseguido acesso a crédito para a criação dos próprios empregos ou postos de trabalho lado a lado com os nacionais, sem qualquer discriminação. Desde o ano de 2016 já foram integradas, desta forma, mais de 3000 pessoas. Parece pouco?
Importa saber que o Ruanda continua a ser um país pobre, que, em 1959, iniciou o processo para se tornar independente da Bélgica. O turismo é a principal fonte de rendimento do país. 90% da sua população vive da agricultura. O Índice de Desenvolvimento Humano é baixo (IDH 0,524 – estimativa de 2017). Tem onze milhões e meio de habitantes. Só tem fronteiras terrestes (com o Uganda, o Burundi, a República Democrática do Congo e a Tanzânia). A capital é Kigali.
O Ruanda, onde uma etnia quase dizimou outra, pode dizer-se que está a dar cartas na integração das pessoas que lá chegam à procura de melhores condições de vida. Oxalá o bom exemplo prolifere.
Que grande invenção esta senhores enfermeiros. Greve cirúrgica para cortar onde dói mais, na reposição da saúde das pessoas.
Todos sabemos que se as greves não prejudicam alguém não têm substância. Não produzem o efeito desejado. Também se sabe que a greve é um direito constitucional. Mas uma greve às cirurgias? Estrategicamente localizada? Não sentem, senhores enfermeiros, que estão a boicotar o direito das pessoas à saúde?
Eu sei que estão a ser seriamente lesados nos ordenados tanto o que decorre do exercício de funções no Serviço Nacional de Saúde (SNS) como para outras possíveis entidades. Pois greve é greve e a Lei institui a perda de vencimento. Ora veja-se o que diz a Lei: “A greve suspende, no que respeita aos trabalhadores que a ela aderirem, as relações emergentes do contrato, nomeadamente o direito à remuneração e, em consequência, desvincula-os dos deveres de subordinação e assiduidade (n.º 1 do artigo 398.º da Lei n.º 7/2009, na sua redação atual)”.
Ah! Sim, é verdade, alguns destes profissionais têm vindo a efetuar uma recolha de fundos para fazer face aos cortes dos vencimentos de quem está a fazer greve. Se assim é só o utente do SNS é prejudicado.
Encontraram uma forma transparente e legal? (a Lei prevê a perda de vencimento). Mas transparente é com certeza, pois sei que contam publicar a lista das pessoas/entidades beneméritas que ajudam à manutenção da greve. Até quando?
Hoje, na praia, uma sombra ridícula fez-me frio. É verdade que só a senti porque do mar chegava uma aragem bem fresquinha. Sem qualquer sombra a brisa passava deixando uma leve frescura na minha pele ainda molhada do único banho do dia.
Durante alguns instantes senti aquele friozinho a rondar e a persistir colado a mim. Levantei a cabeça e vi que o meu chapéu de sol não me fazia sombra. Esqueci a frescura e continuei a ler: “A cabeça abarrotava de preocupação, de inquietude, de desgraça. Ora a camisa se rasgava, ora apareciam abcessos, ora tinha dores de barriga e era impossível arranjar autorização para ir ao médico, ora a pele rebentava nos calcanhares e Macha andava coxeando, com as grevas negras de sangue” (*). Tratava-se de uma mulher presa num campo de trabalhos forçados.
De novo aquela frescura excessiva de quem está à sombra e devia gozar o sol. Ergui outra vez a cabeça e vi uma tirinha de sombra projetada pelo poste das bandeiras da praia.
(*) Tudo Passa, pág. 123, Vassili Grossman, D. Quixote.