Julguei que o avô de Luís Sepúlveda ficcionava, mas enganei-me. Martos existe mesmo. É uma localidade espanhola da Andaluzia.
O escritor chileno conta, no seu livro Patagónia Expresso, um pouco da sua vida, no seu país sem liberdade. O Chile. Esteve preso e foi torturado. À sua prisão chama “um acidente obsceno”. Embora lhe desagrade, escreve sobre esse tempo. A vida dos presos políticos e os seis meses que passou na solitária: um buraco com um metro e meio de largura, o mesmo de altura e igual comprimento, onde para esticar o corpo tinha de se deitar enviesado naquele nojo que havia servido para armazenar gordura, quando lá na prisão existiu uma unidade de curtumes.
Sepúlveda fala, também, sobre os homens de cultura que foram encarcerados e da organização destes, lá dentro, na prisão. Os presos, professores universitários dividiam-se por especialidades e faziam palestras a que todos assistiam, incluindo oficiais do exército. Nesta prisão que, referindo as palestras, pode parecer uma prisão com alguma normalidade, mas os prisioneiros eram sujeitos a interrogatórios e torturados por especialistas, muitos provenientes de países estrangeiros.
O comandante da prisão tinha uma verdadeira adoração pelo nazismo. Sepúlveda diz que não escreve o seu nome “por um elementar respeito ao papel”. O escritor foi libertado por influência da Amnistia Internacional. Recorda: “Enchi os pulmões com ar denso de uma liberdade limitada pelo medo de a perder”.
Mas o que eu queria mesmo trazer para este texto era Martos. Acabo de a descobrir no mapa de Espanha, na Andaluzia. Logo no início do livro, Sepúlveda fala sobre o avô que parece ter moldado a sua personalidade. Certa vez ofereceu-lhe o livro, de Nikolai Ostróvsky, Assim Foi Temperado o Aço, quando ele tinha uns 11 anos. Como condições para lhe entregar o presente pediu-lhe que lhe fizesse duas promessas: uma que faria uma grande viagem e a segunda que iria a Martos. Ele prometeu que faria a tal grande viagem e sobre a ida a Martos também disse que sim, mas perguntou-lhe onde ficava Martos. O avô respondeu aqui, batendo com as mãos no peito.
Luís Sepúlveda termina o livro a contar sobre a sua ida a Martos. Entrou num bar que tinha mudado de nome muitas vezes. Ainda havia por lá quem se recordasse do nome no tempo em que o avô tinha colocado aquela terra no coração: Bar de los Cazadores. Afinal Martos existe mesmo. Fica em Espanha, na Andaluzia. Martos é uma cidade sede do município da província de Jaén.
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